Há dias em
que as águas se fazem mais azuis, como orgulhosas de si mesmas, de um azul tão
profundo que chega a parecer lágrima nas pupilas infantis de Ana.
O sol ganha
mais luz e raios novos para começar a manhã. Há dias que são feitos com
carinhos e cuidados especiais, porque foram marcados, há longo tempo, no
calendário.
As horas
têm, então, um significado certo e precioso – uma fisionomia toda própria. Cada
uma é a data inadiável, repleta de segredo, que fica fazendo surpresa à toa.
Só não as
sente plenas quem está muito inquieto ou descrente da doçura, quem se esqueceu
de prender bem os olhos ao azul mais intenso da água ou aos raios de luz muito
novos.
Há dias em
que as ruas se fazem mais largas e combinam encontro em todas as esquinas, ou
convidam a caminhadas extensas para contar coisas curiosas ou mostrar as
árvores onde dormem nomes entrelaçados.
Esquecem o
tédio e a súplica das mágoas. A música chega tão perto que é parte da cadência
dos gestos e o canto nasce leve, como um pedaço do tempo. Só não os viu quem
não foi tocado pela luz ou o poema que nasce dela.
Depois as
horas amadurecem e tentam fazer tristeza ou convidar a sombra e a solidão.
Chamam a bruma dos dias opacos e desalentados, convidam o silêncio velho. A
saudade debruça-se dolorida sobre as ruas, como se as fadas estivessem mortas e
os sonhos perdidos.
Mas quando a realidade cinge o corpo com braços de terra e medo, os olhos brilham ainda cheios de cores e música. Pois onde houve um dia de luz, há vestígio de alegria, gérmen de sorriso fragmento de esperança. Onde passa o sonho fica um raio luminoso, desafiando os descrentes.